Ensino médio obrigatório - out 2008

A realidade do ensino médio nacional é mais alarmante do que a do ensino fundamental. Dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios) indicam que do total da população de 18 milhões de jovens na faixa etária entre 15 e 19 anos, apenas 25%, ou cerca de 4 milhões, encontravam-se matriculados neste nível de ensino. E desse total, apenas cerca de 2 milhões de alunos concluíram seus estudos.

O grande entrave para a expansão do ensino médio decorre dos custos para estados e municípios. Dados indicam que cerca de 70% das crianças são atendidas hoje na pré-escola. Já o número de adolescentes, entre 15 e 17 anos matriculados no ensino médio, estacionou em cerca de 80% desde 2000. O cálculo dos custos mostra o nível de dificuldade de implantação de uma política conseqüente para o ensino médio, que precisa ser universalizado e ter sua qualidade muito melhorada. O valor mínimo aplicado por estudante do ensino médio urbano pelo FUNDEB é de R$ 1.364,76, e para o aluno da pré-escola, R$ 1.023,57. Para incluir as crianças, nestas faixas etárias que ficam fora da escola, estados, municípios e governo federal teriam de aplicar R$ 4.6 bilhões, valor que a União investe em todos os níveis do FUNDEB. O MEC acaba propondo mais objetivos ideais do que os viabilizando na realidade educacional do país.

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) tem procurado ampliar o debate entre governantes, políticos, professores e estudantes do país acerca deste assunto. Nils Kastberg, diretor regional do UNICEF na América Latina lembra que “é preciso ter em mente que acesso à educação é um direito dos cidadãos. Isso inclui a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio”. Afirma: “Lógico que o Brasil está atrasado ao não ter educação média obrigatória. O Brasil é a décima potência econômica mundial, precisa ter como objetivo ser também a décima potência quanto aos seus recursos humanos. Hoje, está muito distante disso”.

O UNICEF pretende que a obrigação da oferta de vagas no ensino médio aos jovens brasileiros, conduza o governo a criar políticas que valorizem a etapa e garantam o acesso e a permanência dos brasileiros na escola. A obrigatoriedade como política de estado aparece como meta estratégica para a sociedade. A proposta do MEC de 14 anos de ensino obrigatório torna obrigatório a educação de crianças de 4 a até 17 anos. Dois anos de pré-escola, 9 de ensino fundamental e mais 3 de ensino médio. Para que isso possa fazer parte da realidade do ensino deverá ser feita emenda constitucional que hoje só obriga o ensino fundamental.

Boa parte do mundo, incluindo os vizinhos Argentina e Chile, já tem 12 anos de ensino obrigatório. A Argentina aprovou uma lei que obriga a oferta de ensino médio a todos os estudantes e está regulamentando o processo agora. Juan Tedesco, ministro de Educação da Argentina, insiste que as novas regras significam mudanças para todo o país. “Essa decisão implica mudanças profundas na sociedade, que precisa decidir assumi-las. O fracasso escolar, por exemplo, deixa de ser um problema só do aluno e passa a ser do sistema; o governo terá de pensar em ajudar as famílias para que elas deixem os filhos ir para a escola em vez de trabalhar”. O Brasil tem condições de oferecer ensino médio aos brasileiros e o Estado de São Paulo reúne, mais que todos os outros, as condições culturais, sociais e econômicas para implantar o ensino médio obrigatório.

É uma tarefa urgente em face das transformações pelas quais passa a economia global. Sem que os jovens tenham acesso ao ensino médio não se abrem perspectivas de inserção tranqüila no mercado de trabalho no mundo atual. A obrigatoriedade é ponto de partida, mas há muito além de garantir o acesso ao ensino médio. É preciso incluir os alunos no ensino médio, mantê-los na escola e formá-los com qualidade.

A evasão dos estudantes e o fracasso escolar ainda são realidades nos colégios brasileiros responsáveis pelos anos finais da educação básica. O MEC mostra que 8,9 milhões de estudantes estão matriculados no ensino médio. Do total, apenas 44% cursam as séries ideais para a faixa de idade de 15 a 17 anos. A trajetória dos brasileiros é marcada pela reprovação e pelo abandono. Apenas metade dos jovens matriculados no ensino médio em 2004 conseguiu concluir o ciclo de três anos, terminados em 2006. Investir na infra-estrutura das escolas, valorizar os professores, garantindo melhores condições de trabalho, salários mais altos e mais capacitação, modificar os currículos para tornar as aulas mais interessantes e atrativas são algumas das necessidades para a melhoria do ensino. Ir mais longe será definir com clareza os objetivos pretendidos com o ensino médio e procurar fazer cumpri-los.

Este conjunto de objetivos justifica a decisão política de tornar o ensino médio obrigatório no Estado de São Paulo. A obrigatoriedade pode ser um passo adiante no planejamento do ensino. Pode desencadear uma mudança cultural que levará à responsabilização do Estado caso não ofereça vaga para todos e tornará os pais cúmplices de um processo pelo qual se responsabilizam em enviar seus filhos à escola.